ANÁLISE JURÍDICA DA COMPRA E VENDA DE COMBUSTÍVEL EM RECIPIENTES IMPROVISADOS E DEMAIS CONDUTAS RELACIONADAS
Autor: Hans Robert Dalbello Braga (Professor/Mestre)
Com a paralisação dos caminhoneiros e a consequente falta de fornecimento de combustíveis e sua evidente escassez surgiu uma prática, comum em outros momentos, agora evidenciada, de vender combustíveis líquidos (gasolina, etanol e diesel) em recipientes como garrafas pet e embalagens totalmente improvisadas.
Assim sendo, nosso objetivo, com essa breve análise jurídica, é no sentido de responder a seguinte indagação, entre outras relacionadas: A compra e venda de combustíveis (gasolina, diesel e etanol) em recipientes como garrafas pet e embalagens improvisadas caracteriza alguma infração penal?
A venda de combustível adulterado caracteriza crime contra a ordem econômica previsto no art. 1.º inciso I da Lei n.º 8.176/91, que apresenta a seguinte redação: “Constitui crime contra a ordem econômica: Adquirir, distribuir e revender derivados de petróleo, gás natural e suas frações recuperáveis, álcool etílico hidratado carburantes e demais combustíveis líquidos carburantes em desacordo com as normas estabelecidas na forma da Lei; Pena – detenção, de 1(um) a 5 (cinco) anos”.
No tipo penal supra o bem jurídico penalmente tutelado é, principalmente, a política econômica relativa à normalidade do abastecimento nacional de petróleo, de seus combustíveis derivados etc. Pela redação do tipo penal pode-se constatar que se trata de norma penal em branco homogênea heterovitelina, pois este tipo penal é complementado pelas Leis n.ºs 9.478/1997 e nº 9.847/1999, que tratam das atividades de exploração dos recursos energéticos nacionais. É importante salientar que essa norma penal incriminadora visa proibir as misturas e adulterações no combustível (gasolina, etanol diesel etc., todos definidos no art. 6.º da Lei n.º 9.478/97).
É importante ressaltar que esse tipo penal utiliza a expressão “em desacordo com as normas estabelecidas na forma da Lei”, o que caracteriza, no nosso entendimento, manifesta inconstitucionalidade em razão do princípio da taxatividade, corolário do princípio da legalidade penal (vide art. 5.º, inciso XXXIX da CF, art. 9.º do Decreto 678/92, c/c., art. 1.º do CP), pois a lei penal (tipo penal) não define de forma clara e taxativa quais são as condutas que estão em desacordo com as normas estabelecidas, de modo que o tipo penal é extremamente aberto, não pelo fato de ser uma norma penal em branco, o que é totalmente possível, mas por não descrever o comportamento proibido de forma taxativa, clara e precisa, como exige o sistema penal democrático.
Entretanto, é forçoso salientar que esse tipo penal não se coaduna à conduta de vender e/ou comprar combustíveis em recipientes inapropriados.
Na verdade a conduta de vender ou comprar combustível em recipiente inadequado caracteriza CRIME AMBIENTAL, expressamente previsto no art. 56 da Lei n.º 9.605/98, senão vejamos: “Art. 56. Produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa”.
Esse tipo penal é um manifesto exemplo da expansão do Direito Penal (SILVA SÁNCHEZ) decorrente da sociedade de risco (ULRICH BECK). Entretanto, façamos, então, a análise dogmática da conduta supramencionada.
O art. 56 da Lei dos Crimes Ambientais é comum e pode ser praticado tanto por quem fornece quanto por quem guarda, tem em depósito ou armazena a substancia nociva à saúde humana ou perigosa. O tipo penal possui os verbos: produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, guardar, armazenar e ter em depósito. Ademais, o objeto material desse tipo penal é a substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humano ou ao meio ambiente como por exemplo os COMBUSTÍVEIS.
Os combustíveis líquidos (gasolina, etanol ou diesel) são substâncias que se ajustam a esse conceito, nesse sentido é importante frisar a Resolução N.º 420/2004, da Agência Nacional de Transportes Terrestres, que define diversas substâncias ou produtos perigosos, bem como estabelece regras para seu transporte e armazenamento.
Ademais, já está em vigor desde 2008, a norma técnica da ABNT NBR 15.594-1 que proíbe a venda de combustível em “saquinho plástico” e “garrafa Pet”. Sendo assim, se o consumidor vem em busca de combustível para sanar uma pane seca no automóvel, a venda de qualquer combustível fora do tanque só pode ser feita utilizando-se recipientes metálicos ou não metálicos, rígidos, certificados e fabricados para este fim e que permitam o escoamento da eletricidade estática gerada durante o abastecimento. Os nãos metálicos devem ter capacidade máxima de 50 (cinquenta) litros e atender aos regulamentos municipais, estaduais ou federais.
O abastecimento deve ocorrer com o recipiente fora do veículo e apoiado sobre o solo, sendo o bico embutido ao máximo possível dentro dele. Ainda segundo a norma, para evitar que aconteça transbordamento no caso de dilatação do produto, os recipientes devem ser abastecidos em até 95% de sua capacidade.
Portanto, a compra e venda de combustíveis (gasolina, diesel e etanol) em recipientes como garrafas pet e embalagens improvisadas caracteriza CRIME AMBIENTAL, assim como seu depósito ou estoque, punidos, como visto, no âmbito do Direito Administrativo e, sobretudo, do Direito Penal.
Destarte, quem for surpreendido incorrendo nessas condutas delituosas pode ser preso em flagrante, até porque o crime, nos casos dos verbos: armazenar, guardar, ter em depósito, é permanente admitindo até mesmo a prisão em flagrante no domicilio, haja vista o disposto no art. 5.º, inciso XI da CF, c/c., com os arts 301 a 303, todos do CPP.
Portanto, nesse momento de crise no abastecimento de veículos, evite cometer crimes ambientais!
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